terça-feira, 26 de outubro de 2010

CFP repudia demissão da psicóloga Maria Rita Kehl pelo jornal O Estado de S.Paulo

Nota do CFP em repúdio à demissão da psicóloga Maria Rita Kehl pelo jornal O Estado de S.Paulo

Diante da agressão à liberdade de expressão cometida pelo jornal O Estado de S. Paulo contra a psicóloga e psicanalista Maria Rita Kehl, o CFP emitiu a nota a seguir. Para o Conselho, o jornal deu exemplo de produção de alienação pois, ao mesmo tempo em que se diz ameaçado em sua liberdade de expressão, impede a emissão de opinião por articulista que ali escrevia há anos.

Nota:

CFP repudia demissão da psicóloga Maria Rita Kehl pelo jornal O Estado de S.Paulo

No dia 2 de outubro de 2010, a psicanalista e psicóloga Maria Rita Kehl, colunista do jornal O Estado de S. Paulo publicou artigo intitulado “Dois pesos” no qual questionou a desqualificação do voto da população pobre e fez comentários sobre o programa Bolsa Família, do governo Lula. O texto gerou grande repercussão na internet e mídias sociais nos últimos dias e culminou com a demissão da colunista no dia 6 de outubro. Segundo ela, a justificativa dada pelo jornal foi que Maria Rita cometeu um “delito” de opinião.

O Conselho Federal de Psicologia (CFP) repudia a demissão de Kehl, solidariza-se a ela e externa preocupação com a atitude do Estadão que, ao demitir uma articulista que se posiciona de maneira contrária ao discurso do jornal, fere o direito à liberdade de expressão e de pensamento. Ou não é para garantir a diversidade de opiniões que os jornais, além de editoriais, publicam artigos?

A grande mídia tem acusado o governo de cercear a liberdade de expressão e o Estadão há meses questiona um processo de censura. Entretanto, a demissão da colunista expõe a fissura entre o discurso da mídia que se diz ameaçada em sua liberdade de expressão e suas práticas cotidianas, restritivas à liberdade de opinião.
 
 Modificada em 11/10/2010
 

Maria Rita Kehl: "Fui demitida por um 'delito' de opinião"

Bob Fernandes


A psicanalista Maria Rita Kehl foi demitida pelo Jornal O Estado de S. Paulo depois de ter escrito, no último sábado (2), artigo sobre a "desqualificação" dos votos dos pobres. O texto, intitulado "Dois pesos...", gerou grande repercussão na internet e mídias sociais nos últimos dias.
Nesta quinta-feira (7), ela falou a Terra Magazine sobre as consequências do seu artigo:
- Fui demitida pelo jornal o Estado de S. Paulo pelo que consideraram um "delito" de opinião (...) Como é que um jornal que anuncia estar sob censura, pode demitir alguém só porque a opinião da pessoa é diferente da sua?

Veja trechos do artigo "Dois pesos".

Leia abaixo a entrevista.

Terra Magazine - Maria Rita, você escreveu um artigo no jornal O Estado de S.Paulo que levou a uma grande polêmica, em especial na internet, nas mídias sociais nos últimos dias. Em resumo, sobre a desqualificação dos votos dos pobres. Ao que se diz, o artigo teria provocado conseqüências para você...
Maria Rita Kehl -
E provocou, sim...

- Quais?- Fui demitida pelo jornal O Estado de S.Paulo pelo que consideraram um "delito" de opinião.

- Quando?
- Fui comunicada ontem (quarta-feira, 6).

- E por qual motivo?
- O argumento é que eles estavam examinando o comportamento, as reações ao que escrevi e escrevia, e que, por causa da repercussão (na internet), a situação se tornou intolerável, insustentável, não me lembro bem que expressão usaram.

- Você chegou a argumentar algo?- Eu disse que a repercussão mostrava, revelava que, se tinha quem não gostasse do que escrevo, tinha também quem goste. Se tem leitores que são desfavoráveis, tem leitores que são a favor, o que é bom, saudável...

- Que sentimento fica para você?- É tudo tão absurdo... A imprensa que reclama, que alega ter o governo intenções de censura, de autoritarismo...

- Você concorda com essa tese?- Não, acho que o presidente Lula e seus ministros cometem um erro estratégico quando criticam, quando se queixam da imprensa, da mídia, um erro porque isso, nesse ambiente eleitoral pode soar autoritário, mas eu não conheço nenhuma medida, nenhuma ação concreta, nunca ouvi falar de nenhuma ação concreta para cercear a imprensa. Não me refiro a debates, frases soltas, falo em ação concreta, concretizada. Não conheço nenhuma, e, por outro lado...

- ...Por outro lado...?- Por outro lado a imprensa que tem seus interesses econômicos, partidários, demite alguém, demite a mim, pelo que considera um "delito" de opinião. Acho absurdo, não concordo, que o dono do Maranhão (senador José Sarney) consiga impor a medida que impôs ao jornal O Estado de S.Paulo, mas como pode esse mesmo jornal demitir alguém apenas porque expôs uma opinião? Como é que um jornal que está, que anuncia estar sob censura, pode demitir alguém só porque a opinião da pessoa é diferente da sua?

- Você imagina que isso tenha algo a ver com as eleições?- Acho que sim. Isso se agravou com a eleição, pois, pelo que eles me alegaram agora, já havia descontentamento com minhas análises, minhas opiniões políticas.

Maria Rita Kehl: Dois pesos…

5 de outubro de 2010 às 20:23

DOIS PESOS…

por Maria Rita Kehl, no Estadão, via Vermelho

 
Este jornal teve uma atitude que considero digna: explicitou aos leitores que apoia o candidato Serra na presente eleição. Fica assim mais honesta a discussão que se faz em suas páginas. O debate eleitoral que nos conduzirá às urnas amanhã está acirrado. Eleitores se declaram exaustos e desiludidos com o vale-tudo que marcou a disputa pela Presidência da República. As campanhas, transformadas em espetáculo televisivo, não convencem mais ninguém. Apesar disso, alguma coisa importante está em jogo este ano. Parece até que temos luta de classes no Brasil: esta que muitos acreditam ter sido soterrada pelos últimos tijolos do Muro de Berlim. Na TV a briga é maquiada, mas na internet o jogo é duro.
Se o povão das chamadas classes D e E – os que vivem nos grotões perdidos do interior do Brasil – tivesse acesso à internet, talvez se revoltasse contra as inúmeras correntes de mensagens que desqualificam seus votos. O argumento já é familiar ao leitor: os votos dos pobres a favor da continuidade das políticas sociais implantadas durante oito anos de governo Lula não valem tanto quanto os nossos. Não são expressão consciente de vontade política. Teriam sido comprados ao preço do que parte da oposição chama de bolsa-esmola.
Uma dessas correntes chegou à minha caixa postal vinda de diversos destinatários. Reproduzia a denúncia feita por “uma prima” do autor, residente em Fortaleza. A denunciante, indignada com a indolência dos trabalhadores não qualificados de sua cidade, queixava-se de que ninguém mais queria ocupar a vaga de porteiro do prédio onde mora. Os candidatos naturais ao emprego preferiam viver na moleza, com o dinheiro da Bolsa-Família. Ora, essa. A que ponto chegamos. Não se fazem mais pés de chinelo como antigamente. Onde foram parar os verdadeiros humildes de quem o patronato cordial tanto gostava, capazes de trabalhar bem mais que as oito horas regulamentares por uma miséria? Sim, porque é curioso que ninguém tenha questionado o valor do salário oferecido pelo condomínio da capital cearense. A troca do emprego pela Bolsa-Família só seria vantajosa para os supostos espertalhões, preguiçosos e aproveitadores se o salário oferecido fosse inconstitucional: mais baixo do que metade do mínimo. R$ 200 é o valor máximo a que chega a soma de todos os benefícios do governo para quem tem mais de três filhos, com a condição de mantê-los na escola.
Outra denúncia indignada que corre pela internet é a de que na cidade do interior do Piauí onde vivem os parentes da empregada de algum paulistano, todos os moradores vivem do dinheiro dos programas do governo. Se for verdade, é estarrecedor imaginar do que viviam antes disso. Passava-se fome, na certa, como no assustador Garapa, filme de José Padilha. Passava-se fome todos os dias. Continuam pobres as famílias abaixo da classe C que hoje recebem a bolsa, somada ao dinheirinho de alguma aposentadoria. Só que agora comem. Alguns já conseguem até produzir e vender para outros que também começaram a comprar o que comer. O economista Paul Singer informa que, nas cidades pequenas, essa pouca entrada de dinheiro tem um efeito surpreendente sobre a economia local. A Bolsa-Família, acreditem se quiserem, proporciona as condições de consumo capazes de gerar empregos. O voto da turma da “esmolinha” é político e revela consciência de classe recém-adquirida.
O Brasil mudou nesse ponto. Mas ao contrário do que pensam os indignados da internet, mudou para melhor. Se até pouco tempo alguns empregadores costumavam contratar, por menos de um salário mínimo, pessoas sem alternativa de trabalho e sem consciência de seus direitos, hoje não é tão fácil encontrar quem aceite trabalhar nessas condições. Vale mais tentar a vida a partir da Bolsa-Família, que apesar de modesta, reduziu de 12% para 4,8% a faixa de população em estado de pobreza extrema. Será que o leitor paulistano tem ideia de quanto é preciso ser pobre, para sair dessa faixa por uma diferença de R$ 200? Quando o Estado começa a garantir alguns direitos mínimos à população, esta se politiza e passa a exigir que eles sejam cumpridos. Um amigo chamou esse efeito de “acumulação primitiva de democracia”.
Mas parece que o voto dessa gente ainda desperta o argumento de que os brasileiros, como na inesquecível observação de Pelé, não estão preparados para votar. Nem todos, é claro. Depois do segundo turno de 2006, o sociólogo Hélio Jaguaribe escreveu que os 60% de brasileiros que votaram em Lula teriam levado em conta apenas seus próprios interesses, enquanto os outros 40% de supostos eleitores instruídos pensavam nos interesses do País. Jaguaribe só não explicou como foi possível que o Brasil, dirigido pela elite instruída que se preocupava com os interesses de todos, tenha chegado ao terceiro milênio contando com 60% de sua população tão inculta a ponto de seu voto ser desqualificado como pouco republicano.
Agora que os mais pobres conseguiram levantar a cabeça acima da linha da mendicância e da dependência das relações de favor que sempre caracterizaram as políticas locais pelo interior do País, dizem que votar em causa própria não vale. Quando, pela primeira vez, os sem-cidadania conquistaram direitos mínimos que desejam preservar pela via democrática, parte dos cidadãos que se consideram classe A vem a público desqualificar a seriedade de seus votos.

segunda-feira, 4 de outubro de 2010

O corpo cativo: sedução e escravidão feminina


Um dos grandes fenômenos nos dias atuais é o culto ao corpo, a um padrão de beleza idealizada, mistificada pela propaganda, imitação, modelagem exagerada que foge longe da realidade, antes as preocupações eram comportamentais, agora a imagem está à frente de qualquer objetivo.
A mídia tem uma grande parcela de responsabilidade nessa distorção dos conceitos de corpo belo e perfeito, afinal está aí para quem quiser ver e ouvir programas de televisão que mostram homens e mulheres com seus corpos perfeitos e músculos a mostra.
Esses programas só ajudam a reforçar o narcisismo contemporâneo e a sociedade capitalista, onde tudo está à venda, basta querer e poder. Produtos que auxiliam na redução de peso, medicamentos para reduzir o apetite, esteróides anabolizantes sendo vendidos livremente sem qualquer dificuldade para quem quer comprar.
A autora ressalta o lugar que o corpo ocupa para as camadas médias cariocas, afirmando que o corpo feminino valorizado atualmente é fruto do modelo de corpo veiculado pela mídia, o corpo magro, e que a convivência de valores e comportamentos tradicionais e modernos aparece também ao discutir a multiplicidade e a flexibilização dos arranjos conjugais, que é mostrada nas entrevistas feitas pela autora.
Ela compara as expectativas vivenciadas pelos homens e pelas mulheres e em sua pesquisa, destaca que: os homens observa mais a beleza o corpo e o olhar das mulheres enquanto que as mulheres o olhar, o charme, o sorriso, assim as mulheres equilibram as características físicas e os homens dão peso maior às características físicas.
Em se tratando de desejo a escravidão feminina vai além, procura com seu culto ao corpo despertar o desejo masculino, que nesta busca não se mede esforços na conquista para a conquista.
A obsessão pelo estereótipo modelo vai muito além, é um retrocesso de emancipação feminina que virou epidemia, elevando o Brasil para o primeiro do mundo em cirurgia plástica, é uma triste realidade,, pois cada vez mais jovens tornam-se escravo da beleza, pois são alvo fácil pelos seus manipuladores, que a cada dia embolsam mais e mais dinheiro.
Precisamos ter consciência do que pode ser bom ou ruim, pensar que um corpo magro e com músculos definidos não pode ser o único objetivo pelo qual se vive. Colocar a saúde e a qualidade de vida em primeiro plano pode ser a melhor idéia.